Quando sentei para assistir à palestra sobre agentic commerce de Michael Komasinski, CEO da Criteo, eu já estava animada com tudo que tinha lido e ouvido sobre agentic commerce. Ainda assim, foi só ali, na sala lotada do Web Summit, que percebi de verdade por que esse tema tem gerado tanto entusiasmo e também por que ainda não domina as últimas etapas da jornada de compra.
Michael tem aquele estilo raro que combina profundidade técnica com sensibilidade humana. Talvez isso venha de seus mais de 20 anos no AdTech. Foi exatamente essa união entre tecnologia e compreensão do comportamento do consumidor que me permitiu enxergar o agentic commerce de forma completa: com seu enorme potencial, mas também com suas limitações atuais.
O topo do funil nunca foi tão poderoso
Uma das primeiras afirmações de Michael, e que também observo no meu trabalho, é que os agentes de IA transformaram para sempre a etapa de descoberta de produtos. Hoje, eles interpretam intenções complexas, refinam critérios, fazem comparações e organizam informações em segundos.
A força dessa mudança está em algo que Michael resumiu perfeitamente: “Pela primeira vez, o consumidor pode expressar uma intenção complexa sem precisar traduzir isso para a linguagem da máquina.”
Mas esse avanço traz um paradoxo: se o início da jornada funciona tão bem, por que a conversão trava?
O problema não está na conversa, está nos dados
A resposta de Michael foi direta: o desafio do agentic commerce não é conversacional. Ele é estrutural.
Ele compartilhou uma experiência pessoal que deixou isso evidente. Após conversar por mais de uma hora com um agente sobre pneus de bicicleta, com direito a análises de compatibilidade, durabilidade e performance, tudo desmoronou no momento da recomendação. Os problemas foram conhecidos:
itens fora de estoque
links quebrados
preços inconsistentes
modelos desatualizados
A conversa era brilhante, mas a entrega decepcionava.
E então veio a frase que sintetizou tudo: “A IA pode ser extremamente inteligente, mas ela não supera dados ruins.”
Saí dessa parte da palestra com uma convicção: não é a IA que está atrasada, somos nós. Ainda fornecemos dados incompletos, catálogos bagunçados e estruturas que não acompanham a sofisticação dos agentes.
O catálogo é o novo campo de batalha
Outro ponto marcante foi a discussão sobre normalização de catálogo. Michael trouxe números que falam por si:
4,5 bilhões de SKUs no catálogo global da Criteo.
150 classificados como “aspiradores de mão”.
Apenas 50 eram realmente aspiradores após a normalização.
Em resumo, isso revela um problema crucial: não há como exigir precisão de um agente se nem nós organizamos corretamente a informação.
Nesse momento, entendi que o agentic commerce não falha por falta de inteligência. Ele falha por falta de estrutura.
Instant Checkout: um passo necessário, mas não suficiente
Para enfrentar parte dessa lacuna, a OpenAI lançou o Instant Checkout, algo que Michael contextualizou com clareza. Ademais, a possibilidade de pesquisar e comprar em uma única conversa reduz atritos, deixa a jornada mais fluida e, principalmente, gera dados transacionais. E sem dados de compra, os agentes não conseguem melhorar suas recomendações.
Mas Michael fez questão de reforçar: “Isso não resolve tudo. É apenas o começo.”
Iniciativas semelhantes já foram tentadas por Google e Meta, e ambas recuaram. Além disso, o mercado é complexo, o varejo não é homogêneo e o consumidor quer liberdade.
Agentic Commerce: porque os varejistas vão criar seus próprios agentes
Um ponto que dialoga diretamente com a nossa realidade na Nagata & Gasparini é a convicção de que os varejistas vão desenvolver seus próprios agentes. Isso porque eles desejam, e precisam, manter controle sobre:
relacionamento com o cliente
dados estratégicos
personalização da experiência
design da jornada
Estamos caminhando para um cenário AI-first commerce, no qual as marcas terão experiências proprietárias, com recomendações mais precisas e jornadas híbridas, não terceirizadas.
O que tudo isso ensina sobre o nosso trabalho
Enquanto ouvia Michael, me lembrei de quantas vezes encontrei exatamente os problemas que ele citou nos bastidores das operações:
catálogos desorganizados
atributos inconsistentes
sistemas que não conversam
processos desalinhados
dados pouco confiáveis
Em suma, essas falhas, somadas, impedem que o agentic commerce funcione de maneira plena. E elas têm nome: falta de estrutura.
Agentic Commerce: o dever de casa do varejo na era da IA
Para que o agentic commerce cumpra seu potencial, as empresas precisam agir em três frentes principais:
1. Estruturar dados com excelência
Sem dados normalizados, nenhuma recomendação será consistente.
2. Ajustar processos à nova jornada do consumidor
Se o atendimento, o estoque ou o checkout não acompanham o agente, a experiência quebra.
3. Criar estratégia baseada em evidências
A nova era exige decisões sustentadas por dados, não por achismos.
Conclusão: agentic commerce já mudou a descoberta. Agora precisa conquistar a confiança.
Estamos vivendo o maior salto desde o nascimento do e-commerce. Além disso, o agentic commerce já domina a descoberta de produtos. Dessa forma, a próxima etapa é conquistar a confiança do consumidor, e isso depende de:
dados precisos
recomendações robustas
processos integrados
varejistas no protagonismo
consumidores no centro da jornada
Em resumo, saí da palestra de Michael Komasinski com uma certeza: a IA mudou a forma como descobrimos produtos; agora cabe a nós mudar a forma como entregamos a decisão de compra.
É exatamente essa ponte, entre inovação e resultado, que construímos diariamente na Nagata & Gasparini.